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terça-feira, 4 de setembro de 2012

SOMOS TODOS IRMÃOS

NÓS, LATINO-AMERICANOS
Somos todos irmãos
mas não porque tenhamos
a mesma mãe e o mesmo pai:
temos é o mesmo parceiro
que nos trai.

Somos todos irmãos
não porque dividamos
o mesmo teto e a mesma mesa:
divisamos a mesma espada
sobre nossa cabeça.

Somos todos irmãos
não porque tenhamos
o mesmo berço, o mesmo sobrenome:
temos um mesmo trajeto
de sanha e fome.

Somos todos irmãos
não porque seja o mesmo sangue
que no corpo levamos:
o que é o mesmo é o modo
como o derramamos.
TRADUZIR-SE:
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim 
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?
FERREIRA GULLAR
Poeta Maranhense

LUAR DA MINHA TERRA

LUAR DO SERTÃO
 
 
Não há, oh gente
oh não, Luar
Como esse do sertão.

Oh que saudade
Do luar da minha terra
Lá na serra branquejando
folhas secas pelo chão

Este luar cá da cidade
Tão escuro
Não tem aquela saudade
Do luar lá do sertão

Não há, oh gente...

Se a lua nasce
Por detrás da verde mata
Mais parece um sol de prata
Prateando a solidão

E a gente pega
Na viola que ponteia
E a canção
É a lua cheia
A nos nascer do coração

Não há, oh gente...

Coisa mais bela
Neste mundo não existe
Do que ouvir-se um galo triste
No sertão, se faz luar

Parece até que a alma da lua
É que descanta
Escondida na garganta
Desse galo a soluçar

Não há, oh gente...

Ah, quem me dera
Que eu morresse lá na serra
Abraçado à minha terra
E dormindo de uma vez

Ser enterrado
Numa grota pequenina
Onde à tarde a sururina
Chora a sua viuvez

Não há, oh gente...

CATULO DA PAIXÃO CEARENSE 
Poeta Maranhense
(Letra de música)

O PORVIR

SAUDADES NO PORVIR
Eu vou com a noite
Pálida e fria
Na penedia
Me debruçar :
O promontório
De negro dorso,
Qual nau de corso
Se alonga ao mar.

Dormem as horas,
A flor somente
Respira e sente
Na solidão;
A flor das rochas,
Franzina e leve,
Ao sopro breve
Da viração.

Cantando o nauta
Desdobra as velas
Argênteas, belas
Azas do mar;
Branqueia a proa
Partindo as vagas,
Que n' outras plagas
Se vão quebrar.

Eu ponho os olhos
No firmamento:
Que isolamento,
Oh, minha irmã !
Apenas o astro
Que a luz duvida,
Promete a vida
Para amanhã.

Naquela nuvem
Te vejo morta ;
Meu peito corta
Cruel sentir ï
Da lua o túmulo
Na onda ondula,
E o mar modula
Como um porvir..
SOUSÂNDRADE
Poeta Maranhense

AS ÁGUAS PASSAM

MEDITAÇÃO SOBRE  BACANGA



As águas passam

É lua e as casas aparecem.

Sou eu. Narciso que se olha

E fenece.

Tudo é sombra, sombra e nada,

água e silêncio nas folhas e vales

rompidos pelo Bacanga em sulcos

de madrugada.

Faixa de vento na montanha a encher e vazar:

címbalos onde o tédio geme.

É o gigante do não esquecer e as vozes do mangue.

Sangue correndo das imagens mordidas

pelos dentes estranguladores da noite.


Narciso se olha

Satanicamente o brilho dos olhares

buscam o que não existe mais.

Ele vivia além e tinha fome, mas pensava.

Comeu os pensamentos devorando os dias

o nome e a noite.



Doce rio que vem e bóia

na enseada.

Águas barrentas, sujas,

Liberdade que morreu

e se afoga

no Mar.


Medito sobre mim que já sou morto:

as canções fúnebres que me pesam

como pedras no vazio do

lembrar.

- Barquinho de vela

que vai sobre o mar.

Boneca amarela

que me vem roubar.

Meus olhos fenecem e o presságio dorme

no espelho das águas que

escorrem. 
José Sarney
Poeta Maranhense
(A Canção Inicial/1954)