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quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

ADEUS...

A PEQUENA PALAVRA
“E no meio dessa confusão alguém
 partiu sem se despedir; foi triste. 
Se houvesse uma despedida talvez fosse 
mais triste, talvez tenha sido melhor assim,
 uma separação como às vezes acontece
 em um baile de carnaval — uma pessoa 
se perda da outra, procura-a por um
 instante e depois adere a qualquer cordão.

 É melhor para os amantes pensar 
que a última vez que se encontraram
 se amaram muito — depois apenas 
aconteceu que não se encontraram mais. 
Eles não se despediram, a vida é que
 os despediu, cada um para seu lado — 
sem glória nem humilhação.

Creio que será permitido 
guardar uma leve tristeza, e também
 uma lembrança boa; que não será proibido
 confessar que às vezes se tem 
saudades; nem será odioso dizer 
que a separação ao mesmo tempo nos
 traz um inexplicável sentimento
 de alívio, e de sossego; e um indefinível 
remorso; e um recôndito despeito.

E que houve momentos perfeitos que 
passaram, mas não se perderam, 
porque ficaram em nossa vida;
 que a lembrança deles nos faz
 sentir maior a nossa solidão; mas que
 essa solidão ficou menos infeliz: 
que importa que uma estrela já esteja
 morta se ela ainda brilha no fundo de
 nossa noite e de nosso confuso sonho?

Talvez não mereçamos imaginar que
 haverá outros verões; se eles vierem,
 nós os receberemos obedientes como
 as cigarras e as paineiras — 
com flores e cantos.
 O inverno — te lembras — nos maltratou;
 não havia flores, não havia mar, 
e fomos sacudidos de um lado para
 outro como dois bonecos na mão 
de um titeriteiro inábil.

Ah, talvez valesse a pena dizer que houve
 um telefonema que não pôde haver; 
entretanto, é possível que não adiantasse
 nada. Para que explicações? 
Esqueçamos as pequenas coisas
 mortificantes; o silêncio torna
 tudo menos penoso;lembremos apenas 
as coisas douradas e digamos apenas
 a pequena palavra: adeus.

A pequena palavra que se alonga
 como um canto de cigarra
 perdido numa tarde de domingo.”
Extraído do livro 
de Rubem Braga 
“A Traição das Elegantes”

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